terça-feira, 24 de junho de 2008

Menina não joga

O meu filho de cinco anos amanhã vai jogar futebol. É uma coisa à séria, no campo relvado do clube cá da terra e, por isso, só os rapazes jogam. As meninas fazem claque (estão a ver o estilo "cheerleader" americana?, é isso). Quando eu soube, nem queria acreditar. Ele já me tinha dito que os rapazes iam jogar e as meninas iam "fazer sexy" (palavras dele, acompanhadas de abanar do rabo e braços no ar), mas achei que era confusão dele. Afinal, a criança tinha mesmo razão.
Coincidência ou não, na minha escola (que pertence ao mesmo agrupamento da escola do meu filho) existe um projecto para promover a igualdade entre homens e mulheres. Nunca precisei de um projecto para falar de igualdade com os meus alunos e não sei se gosto desta ideia de fazer projectos para tudo, mas participei. Fizemos formação, delineámos o projecto e passámos ao trabalho. Durante boa parte do ano lectivo, os professores debateram o tema com os alunos, questionaram estereótipos, realizaram trabalhos e hoje apresentaram os resultados. Houve exposição, peça de teatro, filme, palestra com oradores convidados. Estamos satisfeitos.
Mas será que este trabalho tem efeitos na mudança de comportamentos e mentalidades dos nossos alunos? É cedo para saber isso, e talvez nunca se venha mesmo a saber. O inquérito realizado à população não mostrou nada de supreendente, somos uma sociedade conservadora, na qual homens e mulheres ainda têm papéis muito tradicionais. Mudar isto só pode ser conseguido com um trabalho continuado. Uma vez sensibilizados para a questão, professores e alunos (perdão, professores e professoras, alunos e alunas) devem olhar a realidade com uma visão mais crítica e corrigir os comportamentos que alimentam os estereótipos e as desigualdades de sexo, e que de tão naturais às vezes são invisíveis.
Tão invisíveis que não deve ter passado pela cabeça da educadora do meu filho que aquilo que os meninos e meninas vão fazer amanhã é não só muito preconceituoso, como perpetua estereótipos que a escola devia combater.
Contradições da educação para a igualdade...

terça-feira, 17 de junho de 2008

Quando entro nos teus olhos

quando entro nos teus olhos
o amor olha pr'a mim
só agora o encontrei
só agora o conheci

e se mais ao fundo for
muito mais consigo ver
quando entro nos teu olhos
logo o chão fica a tremer

beijos tantos como as estrelas
dorme bem, eu vou voltar
luas muitas e cerejas
amanhã eu vou voltar

quando entro nos teus olhos
flutuando no teu rio
vão descendo luas cheias
neste meu sonho vazio

esqueço tudo o que aprendi
não sabia que era assim
quando entro nos teus olhos
o amor olha para mim

Rádio Macau

(e não é que, ao fim destes anos todos, ainda é mesmo assim?)

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Should I stay or should I go?




Oscar Wilde disse: “Só há duas desgraças na vida: uma é desejar o que não se tem, outra é obtê-lo.”. E não é que é mesmo verdade? Tantos anos a sonharmos com uma vida diferente, tantas vezes a dizermos “se arranjasse outra coisa para fazer, ia-me embora, deixava isto tudo”. E agora que surge a oportunidade, parece que afinal não queremos. Quer dizer, queremos mas... talvez não queiramos tanto como pensávamos. Estão a ver?
Finalmente temos a vida arrumadinha, uma família, a casa dos nossos sonhos, um emprego estável (já foi melhor, mas ainda assim...) e vamos deixar tudo isso? E poderemos ficar sem nos arrependermos? Quando pensamos que podemos estar descansados vem a vida e baralha tudo outra vez. É isto que a torna tão fascinante, mas às vezes apetecia não ter tomar decisões. Nestas alturas dava mesmo jeito ter uma bola de cristal para espreitar o futuro.

sábado, 14 de junho de 2008

Viver sempre também cansa

Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?

José Gomes Ferreira, "Viver sempre também cansa"

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Procura-se alguém para partilhar uma solidão


Quando é que estamos sozinhos? Quando ninguém nos procura? Quando nos encontramos no meio da multidão e ninguém nos vê? Quando as pessoas com quem convivemos não entendem o que pensamos? Quando achamos que mais vale calarmo-nos do que falar?
Um cínico diria que estamos sempre sozinhos. Não sou assim tão cínica. Embora veja como as pessoas vivem cada vez mais sós, dominadas pelo individualismo, pressionadas pelo sucesso e pela felicidade que a sociedade lhes exige, incapazes de ver os outros e ignoradas pelos outros. Muitas vezes abandonadas.
Reconheço que a solidão é uma parte importante das nossas vidas e que nos momentos cruciais nos encontramos sós perante nós mesmos. Sei que é necessária alguma solidão para sabermos quem somos e nos tornarmos mais fortes. Acredito, no entanto, que num mundo tão grande existem uma ou duas pessoas que nos entendem e não nos deixam sós. Mesmo quando nos sentimos sós. E que vale a pena procurá-las.

domingo, 8 de junho de 2008


“Mas no fundo da tua alma escondia-se uma emoção convulsiva – o desejo de ser diferente daquilo que eras. É a maior tragédia, com que o destino pode castigar o homem. O desejo de ser outro, diferente daquilo que somos: não pode arder um desejo mais doloroso no coração humano. Porque não é possível suportar a vida de outra maneira, apenas sabendo que nos conformamos com aquilo que significamos para nós próprios e para o mundo. Temos de nos conformar com aquilo que somos e de ter consciência, quando nos conformamos, de que em troca dessa sabedoria, não recebemos elogios da vida, não nos põem no peito nenhuma condecoração por sabermos e aceitarmos que somos vaidosos ou egoístas, carecas e barrigudos – não, temos de saber que por nada disso recebemos recompensas, nem louvores. Temos de suportar; o segredo é isso. Temos de suportar o nosso carácter, o nosso temperamento, já que os seus defeitos, egoísmos e avidez, não os mudam nem a experiência, nem a compreensão. Temos de suportar que os nossos desejos não tenham plena repercussão no mundo. Temos de suportar que as pessoas que amamos, não nos amem, ou que não nos amem como gostaríamos. Temos de suportar a traição e a infidelidade, e o que é mais difícil entre todas as tarefas humanas, temos de suportar a superioridade moral ou intelectual de uma outra pessoa.”
Sándor Márai, in As velas ardem até ao fim

Mais um treinador de bancada

O meu filho tem cinco anos e está a viver o seu primeiro Europeu de Futebol. Aliás, que eu tenha notado, está a ver jogos de futebol a sério pela primeira vez. Até aqui, tudo o que fazia era perguntar se quem estava a jogar eram o Benfica e o Sporting.
Não sei em que momento é que isto mudou. De repente, a febre do futebol parece ter-se apossado dele. Só quer jogar à bola, passa o tempo a dizer que é o Cristiano Ronaldo, usa vocabulário futebolístico que não me lembro de lhe termos ensinado... Tanto quanto sei, esta febre parece ter afectado todos os colegas da turma dele e teve como consequência obrigar-nos a levar uma bola de futebol para a escola todos os dias.
Quando o vejo sentado em frente ao televisor, a vibrar com os golos, a reclamar com o jogador que não marcou, ou a descrever os lances mais entusiasmantes, parece-me já um rapaz crescido. Tenho a certeza que dentro de pouco tempo o poderemos ouvir questionar as opções do treinador e insultar o árbitro. E assim se faz um homem.

sábado, 7 de junho de 2008

Força, Portugal!



Em qualquer sítio do mundo, se dissermos que somos portugueses a reacção é logo: "Ah sim! Eusébio! Figo! Cristiano Ronaldo!" (consoante a idade do nosso interlocutor). Apesar de sermos bons noutras coisas (vejam-se as vitórias de Vanessa Fernandes no triatlo, os trabalho de investigação dos nossos cientistas ou o sucesso de algumas empresas na tecnologia de ponta, para dar só três exemplos), o futebol continua a ser o nosso cartão de visita.
Não sou grande fã de futebol e confesso que tenho dificuldade em perceber o histerismo à volta da selecção: os directos para saber o que comeram os jogadores ao pequeno-almoço, os passeios do treinador, ou as entrevistas aos adeptos que tentam obter um autógrafo. Enfim, o folclore que envolve estas coisas.
Ainda assim, logo à noite estarei em frente à televisão a ver o jogo e a torcer pelos nossos jogadores. É que quando vemos a selecção sentimo-nos um pouco mais portugueses, unidos num desígnio comum que parece faltar-nos em tantas outras situações.
"Força, Portugal!"

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Que saudades!


Tenho uma estante nova no meu escritório. Ao fim de tanto tempo a olhar para caixotes, posso enfim olhar novamente para os meus livros. Tinha saudades deles, dos livros. Na verdade, sobrevivi perfeitamente todos estes meses sem eles, mas, ainda assim, faziam-me falta. Vê-los assim todos arrumadinhos e prontos a serem lidos e manuseados dá-me um prazer que tenho dificuldade em traduzir em palavras.

Noutro dia, perguntei a um dos meus alunos o que fazia nas duas horas que tem de esperar diariamente pelo autocarro. Respondeu-me: "Nada!". E eu, feita tonta, sugeri "Podias ler um livro.". Pela expressão de absoluta incredulidade na sua cara, percebi imediatamente que tinha dito um disparate. "Ler?!! Nem em casa, quanto mais..."

Pronto, a este não vou conseguir explicar a falta que os meus livros me fizeram. É pena!