terça-feira, 28 de outubro de 2008

Se a nossa vida fosse um filme...

(de preferência uma comédia romântica) talvez pudéssemos contar com um desfecho feliz para as nossas histórias. Contudo, a nossa vida parece-se mais com aquelas "soap operas" americanas (tipo "Dallas", lembram-se?), em que a história pode continuar indefinidamente e, quando se pensa que tudo está mais ou menos resolvido, acontece sempre alguma coisa que lança a confusão e relança a intriga. E assim, não há "happy ending" nem "they lived happily ever after" que resistam... tudo é provisório. Como se vivêssemos numa sucessão de filmes, e este ainda não terminou, já está a começar o próximo.
Na maratona cinematográfica que é a nossa vida, ganham os mais resistentes.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Valsinha

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a dum jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a a só num canto, para seu grande espanto convidou-a pra rodar
Então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça foram para a praça e começaram a se abraçar
E lá dançaram tanta dança que a vizinhana toda despertou
E foi tanta felicidade que toda a cidade enfim se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que todo mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz

Vinicius de Moraes

E um poema lindo destes só pode mesmo melhorar na voz de Chico Buarque:
http://br.youtube.com/watch?v=uSz17T7ue6Q

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Palavras



Andamos a desperdiçar as palavras. A gastá-las com pessoas que não as entendem. A usá-las para dizer coisas sem importância. A desvalorizá-las com a forma como as desbaratamos. Sim, porque as palavras são preciosas. Se bem usadas, ajudam a dar sentido ao nosso mundo, a arrumar a forma como olhamos o mundo e como o mundo nos vê. Mas, quando mal usadas, as palavras são uma fonte equívocos e distorções.
Talvez agora seja tempo de nos calarmos um pouco. De voltarmos à leitura e à escrita em busca da essência das coisas. Em busca da essência das palavras.

Ergo à minha volta um muro de palavras belas e delicadas e escondo-me atrás dele para recuperar o fôlego e enfrentar o absurdo do mundo lá fora.

domingo, 19 de outubro de 2008

Older but wiser (hopefully)

Tenho sorte. Às vezes, esqueço-me disso, mas sei que tenho sorte. A minha vida (apesar das dúvidas, das angústias, de todo o sofrimento) aproxima-se muito do que sonhei para mim. E, sempre que reúno na casa que construímos para a nossa família aqueles de quem gosto, tenho a certeza que estes 36 anos fazem (algum) sentido.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Filho meu, nunca!

A propósito de um comentário de um dos meus alunos sobre a vergonha de ter um filho com uma deficiência mental, perguntei numa turma só de rapazes: "O que seria pior para vocês: ter um filho com uma deficiência mental ou um filho homossexual?". Obviamente a pergunta não faz sentido mas era uma provocação declarada, uma vez que conheço os seus preconceitos. E a reacção foi absolutamente instintiva, todos afirmaram que preferiam um filho com uma deficiência mental. Sim, porque quando se lhes fala em homossexualidade, eles, que são todos muito "machos" e passam o tempo a falar de "gajas", ficam logo alvoroçados, como se estivessem eles a ser insultados. "Filho meu, nunca!Punha-o fora de casa!". E não há argumentação que os demova.
Contei esta história, em jeito de anedota, aos outros professores e toda a gente se riu. Porque o preconceito deles é tão arreigado e a forma como se exprimem é tão absurda que não podemos deixar de nos rir. Mas a verdade é que devíamos era estar tristes. Eles, rapazes de 15/16 anos, são um espelho do Portugal profundo onde vivem. Enquanto as elites discutem o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, devem existir por este país fora muitos rapazes e raparigas, homens e mulheres, com dificuldade em assumir a sua sexualidade por viverem em meios onde o pensamento dominante continua a ser o da incompreensão, da repressão e da marginalização.
Quanto aos meus alunos, só me resta esperar que, se um dia forem confrontados com o facto de terem um/a filho/a homossexual, o amor deles pelos filhos fale mais alto do que o preconceito.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Ensinar: um desafio



Imaginem o que é entrar todos os dias em salas de aulas cheias de adolescentes com esta postura. É que é fácil ensinar quem quer aprender, o desafio está em ensinar quem se recusa a ser ensinado. Bem certo que muitas vezes é só pose, mas ainda assim...
Não esquecer: por trás de cada adolescente enfastiado com a escola há um jovem que pode ser cativado. Isso é um trabalho que requer tempo, disponibilidade e persistência.
Há desafios que vale a pena aceitar.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Mãe solteira

Levanto-me, tomo banho, visto-me, faço a minha cama, acordo o miúdo, visto-o, faço a cama dele, dou-lhe o pequeno-almoço, preparo a merenda, agarro a mochila dele, a minha pasta, a mala do computador, saímos de casa, deixo-o na escola, vou para a minha escola, dou aulas todo o dia, tenho reunião, meto-me no carro, vou buscar o miúdo a casa dos avós (depois de um dia de aulas, duas horas de prolongamento e, quem sabe, mais umas horas com os avós), chegamos a casa, brincamos um pouco, preparo o jantar, dou banho ao miúdo, jantamos, jogamos um jogo, contamos uma história, cantamos uma canção, o miúdo dorme, sento-me ao computador, preparo as aulas do dia seguinte, chego à cama morta, adormeço. E no outro dia começa tudo de novo...

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Madrinhas

Toda a vida lhe chamei madrinha e não percebia por que é que as outras pessoas achavam isso estranho. Não sou baptizada e os meus pais nem sequer casaram pela igreja, mas tanto eu como a minha irmã tivemos madrinhas. Eram amigas da minha mãe a quem víamos pouco, mas que nunca se esqueciam de nos mandar prendas no Natal. Quando casei (pelo civil), convidei a minha madrinha para ser novamente minha madrinha, e lá foi ela assinar no lugar reservado às testemunhas, que é onde assinam as madrinhas de quem não casa pela igreja. E, assim, renovámos a nossa relação.
Por isso, pareceu-me natural quando uma das minhas amigas me convidou para ser madrinha da sua primeira filha, embora não pensasse baptizar a criança. Foi assim que me tornei madrinha da Mariana, a primeira gravidez que acompanhei de perto, a primeira bebé que peguei recém-nascida. Por isso também, pareceu-me natural escolher uma madrinha para o meu filho, ainda que não esteja a pensar baptizá-lo.
Gostava de ter um papel importante na vida da minha afilhada. Gostava que a madrinha do meu filho nunca deixasse de fazer parte da vida dele. Convidar alguém para madrinha é uma forma de distinção, ser madrinha é um motivo de orgulho. E isso são coisas que vale a pena preservar.