sábado, 29 de novembro de 2008
O pátio do liceu
Há anos que não entrava no pátio do Liceu. Na verdade, não sei se terei lá entrado muitas vezes desde que deixei de estudar no Liceu há quase vinte anos. Muita coisa mudou, sobretudo eu, claro, mas também o próprio pátio. Nessa altura, ainda não se tinham lembrado de fechar o pátio e instalar ali o bar, pelo que durante o Inverno era desabrigado e frio, sem nada que o separasse do jardim ou que impedisse a chuva de entrar pela clarabóia por cima do lago (vazio) que se encontrava no centro. Também não existiam todas aquelas tribos diferentes de alunos que agora o povoam, nesse tempo de um lado tínhamos os betos (rapazes e raparigas de ar arrumadinho, pullovers verdes ou vermelhos de decote em bico, botas alentejanas mandadas fazer por medida, mini-saias xadrez e mocassins), do outro os vanguardistas (pessoal que vestia de preto e que, para os padrões da época, tinha um ar mais alternativo e contestário). Eu, a quem faltavam alguns requisitos para ser uma verdadeira beta, especialmente o dinheiro para fazer um certo tipo de vida, passei todos os anos de secundário a tentar parecer-me com as minhas amigas betas e a olhar com um certo espanto e indiferença a tribo dos vanguardistas, que, agora que penso nisso, devia ser mais heterogénea e interessante do que na altura terei tido consciência. Foram precisos muitos anos para me livrar de certo tipo de preconceitos e descobrir que era mais do que uma menina betinha e bem-comportada. Talvez por isso, quando agora entro no liceu, gosto de observar os adolescentes e as suas tribos. São tão diferentes e, ao mesmo tempo, tão parecidos com o que nós fomos: procurando encontrar o seu lugar no mundo, usando a aparência para se afirmarem, integrarem ou revoltarem contra o mundo, vivendo as mesmas dúvidas existenciais, enfim, crescendo.
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